15 de junho de 2023 | Leitura: 4min
Em uma carta de 1675 para o cientista Robert Hooke, o físico inglês Isaac Newton escreveu palavras que ainda ecoam em nossos tempos: “Se enxerguei mais longe é porque me apoiei sobre os ombros de gigantes”. Newton se referia à sua brilhante teoria da Mecânica, em que definia a foça da gravidade e a interação que essa força permite aos corpos, mesmo à distância. A partir daquele momento a Física assumia outra dimensão, passando a ser vista como um dos principais alicerces da Ciência.
Nesse cenário, uma pergunta quase nunca é feita, e essa pergunta é o tema deste texto (ainda que em outro contexto): mas e os gigantes? O que foi feito deles?
Não me refiro aqui aos gigantes de Newton (Kepler, Galileo, Copérnico, para ficarmos nos mais recentes e famosos), mas sim aos gigantes em geral, aqueles que desbravam o caminho, avançam seus campos de atuação, mas que quando chega o que se apoia em seus ombros, são relegados ao segundo plano da História.
Nasce os gigantes canadenses
Três desses gigantes dos tempos modernos são Mike Lazaridis, Doug Fregin e Jim Balsille, os dois primeiras os fundadores da empresa canadense Research In Motion (RIM) e o terceiro o investidor que se tornou co-CEO da empresa e a impulsionou para o sucesso. Eles são os personagens principais do filme “BlackBerry”, lançado esse ano e que agora chega às plataformas de streaming. O filme conta a história dos três e da RIM, em sua estupenda trajetória no competitivo mundo dos smartphones.
Como todo gigante, esses três surgiram pequenos, em uma cidade mediana do Canadá, chamada Waterloo. Lazaridis e Fregin — dois entusiastas da tecnologia mais interessados nas projeções de filmes “nerd” que promoviam para os funcionários do que em ganhar dinheiro — eram excelentes engenheiros que viam na ociosidade da banda passante de celular uma oportunidade para trafegarem dados. O problema é que eram péssimos em fazer negócios e estavam sendo engolidos pelos grandes (no caso, pela 3COM, gigante dos modems e das redes da década de 1990).
Entra em cena Jim Balsille, recém despedido da empresa de investimentos em que trabalhava, que enxergou na ideia de Lazaridis e Fregin uma oportunidade. Essa união — extrema competência técnica com um instinto “matador” para os negócios — seria a combinação perfeita para levar a RIM ao sucesso. Isso e o fato de que em 1996 os celulares eram apenas dispositivos para fazer chamadas, e o máximo que se tinha em termos de tráfego de dados eram os pagers. Neste cenário, o surgimento do Blackberry, um aparelho celular que permitia o envio e o recebimento automático de e-Mails, caiu como uma bomba no mercado.
Crescimento vertiginoso
Em questão de poucos meses o aparelho se transformou em uma sensação, um objeto de desejo, um símbolo de status, uma ferramenta de produtividade como nenhuma até aquele momento da nascente era digital. Aqueles que podiam pagar pelo dispositivo tinham a capacidade de receber e enviar e-Mail de onde estivessem, adicionando os dados à mobilidade do celular.
No seu auge, o BlackBerry ganhou o apelido de “crackberry”, uma alusão ao crack, de tato que seus usuários (há!) dependiam dele. Nesse caminho de crescimento a empresa conseguiu evitar uma compra hostil tentada pela 3COM, e contatou alguns dos principais engenheiros do planeta. No fim de 2007 a empresa controlava 45% do mercado de celulares, o que é ainda mais impressionante quando se considera que as gigantes da época: Motorola, Siemens, Ericsson, Nokia tinham várias décadas de mercado, cofres gigantescos e muita experiência com eletrônica digital e comunicação celular, e ainda assim se dobraram diante da jovem empresa canadense.
No meio do caminho tinha uma maçã
Só que em 2007 um evento tectônico transformaria todo o cenário: nascia o iPhone. No filme o lançamento é visto com entusiasmo por todo o corpo de engenheiros da RIM, mas é recebido com desdém por Lazaridis. O fundador da RIM insistia que “todo mundo ama o teclado mecânico do BlackBerry, e nada se compara ao ‘clic’ do produto.” Pois é… triste, né? Alguém ainda sente falta dos teclados mecânicos ou do “clic”?
A gigante RIM não percebeu que Steve Jobs subia e se alicerçava confortavelmente sobre seus ombros, e o resto é história. Ainda me lembro das matérias daquela época sobre o lançamento do iPhon: alguns poucos, como o jornalista Walt Mossberg, se impressionando com a simplicidade e potencial do aparelho, enquanto a maioria dos executivos já estabelecidos faziam troça da Apple: “500 dólares pr um aparelho sem subsídio? Hahaha”, ria Steve Balmer, da Microsoft. “Esses caras de PC não vão simplesmente entender as coisas. Eles não vão simplesmente entrar nesse mercado” desdenhava Ed Cooligan, CEO da Palm. Gigantes, todos gigantes.
Os teclados mecânicos se foram e junto com eles, o BlackBerry. Os gigantes caíram, e em seu lugar hoje temos outros ainda maiores.
Mas o que fica da história da RIM não é o tombo, mas sim a lição de que mesmo quem nasce pequeno tem condições — se tiver competência — de se tornar gigante. Fácil não é, obviamente. Mas estão aí Mike Lazaridis, Doug Fregin e Jim Balsille para demonstrar que é possível.
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